domingo, 18 de janeiro de 2015

As mulheres e a auto-mutilação

   Vi outro dia essa notícia sobre uma indiana que estava em greve de fome por 14 anos, para protestar contra o sistema em que vivia e fiquei pensando nesse assunto. Lembrei da História do Feminismo da Nuria Varela, em que ela contava que muitos dos protestos pacíficos foram uma invenção feminina (ou feminista) e fiquei pensando nisso, na greve de fome e como ela é uma forma de auto-mutilação, assim como são os transtornos alimentares e os cortes auto-infligidos.
   Muito da auto-mutilação vem de uma agressivdade mal direcionada. Em vez de ela fluir para o alvo da nossa indignação ou raiva, ela se volta para nós. E sendo nós mulheres, socializadas para engolir nossa raiva, e para carregar nos ombros toda a culpa cristã, é natural que a auto-mutilação seja comum entre nós. E não sei se com isso quero dizer que está errado o pacifismo por inteiro ou fazer greve de fome. De fato, nossa raiva nem sempre pode ser bem direcionada. É difícil lidar com essa energia, entre nós. Ainda não encontramos o equilíbrio entre sentir e armanezar ódio e rancor e a auto-punição ou simplesmente sentir raiva. Lembro quão cedo comecei a me auto-mutilar: eu ainda era criança, discuti com a minha mãe, eu nem lembro por quê, mas me sentia tão culpada que esfreguei os nós dos dedos no tanque de pedra até ficarem em carne viva. E até hoje (inclusive agora), nos momentos de culpa ou raiva fico na cama fantasiando formas de auto-mutilação. Acho que é por isso que às vezes fico pedindo  menos rigor... acho que é um pedido para mim mesma de perdão: você não merece sofrer, apanhar, morrer por isso. Fico falando é pra mim mesma, num processo de auto-convencimento.
   Acho que precisamos refletir um pouco sobre tudo isso, sobre nossa forma de sentir e externar a raiva e como canalizamos nossa agressividade. E fica a pergunta sobre o pacifismo: seria energia mal-canalizada? Será que se canalizássemos essa agressividade de forma direta, não seria bom não só pra nós mesmas como também para alcançar os nossos objetivos?

2 comentários:

Picilinha disse...

Senti algo bom, me senti um tanto compreendida, obrigada

Evelyn Cia disse...

Adorei o texto Marce! Pensei tbm nas outras formas de mutilação como depilação, plásticas, e como a nós mulheres foi vetado o direito de externalizar a raiva. Lembro que na faculdade alguem disse que é importante colocar os meninos em esportes pra que eles possam externalizar sua raiva,mas e nós? Que tbm odiamos,sentimos muita raiva e fúria... Só podemos guardar essa energia que vai encontrar sua válvula de escape